terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

"Tigres", meu novo EP

Alô, pessoal!
 
Após um longo período sem postagens, estou reativando o blog para divulgar e falar um pouco sobre esse novo trabalho que fiz; o EP "Tigres".
 
Antes de mais nada, cabe ressaltar que o trabalho não conta com grande produção. Eu mesmo gravei, mixei e masterizei todas as faixas, com os equipamentos que disponho em casa. Todas as músicas foram compostas por mim. Também gravei todos os instrumentos e criei todas as programações. É um trabalho bem pessoal e intimista, por sua natureza. E qual é essa natureza? Bem, vamos lá.
 
Certa vez, eu estava lendo o livro "1808", de Laurentino Gomes, que trata da fuga da família real portuguesa para o Brasil durante as guerras napoleônicas. E nesta leitura, me deparei com a figura dos "tigres"; eram escravos que tinham a árdua tarefa de carregar os baldes com dejetos humanos das casas de seus senhores, para serem esvaziados em uma área específica da cidade. Eles carregavam os baldes nas costas, e aquela mistura de urina e fezes ia aos poucos se derramando neles. Com o sol quente, a pele riscada pelo caminho do líquido ia ficando marcada, e daí o "apelido".
 
Ler isso mexeu bastante comigo, e a história dos "tigres" nunca mais saiu da minha cabeça. Pensar que isso era uma realidade cotidiana de apenas 200 anos atrás, nas ruas da capital do Brasil, é algo chocante.
 
Neste mesmo período, eu me aprofundei muito em pesquisas e leituras sobre o alcoolismo. Eu queria entender a experiência de outras pessoas, os impactos no cérebro e na saúde, física e mental. Eu queria, acima de tudo, entender a minha própria experiência. Saber em qual estágio da cadeia eu me encontrava, e quão preocupado você deve ficar quando começam a aparecer certos sintomas no seu corpo e na sua vida.
 
Um belo dia, eu estava no banho e comecei a cantarolar um refrão, que viria a ser da música "Fazer o Que". A música trazia um personagem alcóolatra, que dizia que já bebeu todas as mágoas do mundo, e o que que ele poderia fazer, se as mágoas do mundo são mais fortes do que ele. E na mesma hora me veio um estalo muito forte: esse seria o tema do meu trabalho; "tigres" do meu cotidiano, os escravos do vício. Os tigres que se rastejam na mesma lama dos de outrora, em razão de uma escravidão psicológica e física imposta por alguma substância.
 
Para escrever as músicas, eu me baseei obviamente em minha própria experiência de vida, acrescendo elementos que encontrei em textos sobre o tema, criando uma estrutura cronológica que se denota da ordem das músicas. Assim, o trabalho está de certa forma dividido em Embriaguez / Ressaca / Doença / Cura. As quatro músicas representam, respectivamente, cada um desses estágios. Ressalto que não sou e nem quero me passar por psiquiatra. A explanação das músicas não traz a verdade absoluta sobre os temas; é apenas um registro daquilo que me baseei para criar as letras.
 
Não são músicas alegres, para dançar, agitar festa, nem tocar na rádio. São músicas intimistas, depressivas, e acima de tudo, honestas. A gravação não é boa, como eu já expus acima, mas fiz o melhor que pude com esse tema tão complexo. E espero que o trabalho seja compreendido dentro desse aspecto conceitual, que eu, particularmente, considero bastante relevante.
 
Obrigado pela leitura, e vamos às músicas.

"TIGRES"
 
PARTE 01 - "HOJE AINDA NÃO"
 
Esta música representa a Embriaguez. A nostalgia e a compulsão se unem para criar um ambiente de revisita interminável aos mesmos lugares, aos mesmos bares. A vontade de perpetuar o momento e a sensação de prazer criada pela bebida (ou outra substância, como queira) faz com que nunca se queira dar-se por vencido e encerrar o consumo. A consequência inexorável é a perda dos sentidos, quando o corpo entrega os pontos e apaga, e consequente amnésia.



PARTE 02 - "FAZER O QUE"

Esta música representa a Ressaca. Acordar após uma bebedeira barra pesada não é fácil. Tudo está fora do lugar, bagunçado. Não se lembra onde estão as coisas, ou até mesmo como foi parar em casa (se é que está em casa). A ressaca por si só dá uma sensação de baixo astral na pessoa. E dependendo da graduação da ressaca e das consequências acarretadas na vida da pessoa, se transforma em uma real sensação de depressão. A bebida (ou outra substância, como queira) é responsável por causar danos à vida pessoal e profissional da pessoa, podendo acarretar em dissolução da unidade familiar, e em casos mais graves e não pouco frequentes, violência doméstica.



PARTE 03 - "SAHOS"
 
Essa música representa a Doença. É de notório conhecimento popular que o consumo excessivo de bebida (ou outra substâ... você já sabe, né?) causa problemas à saúde, podendo inclusive levar à morte. No caso, foquei em um problema que eu tive pessoalmente. Após uma semana na qual bebi bastante, chegou finalmente o dia em que o corpo pediu arrego e fiquei em casa quieto para "curtir" a minha ressaca. A minha respiração estava um pouco travada, o corpo não estava funcionando totalmente bem. Quando chegou à noite e fui dormir, comecei a sofrer com uma apneia (SAHOS) muito forte. SAHOS significa Síndrome de Apneia e Hipopneia Obstrutiva do Sono. Isso pode ser causado por uma série de fatores, incluindo o consumo do álcool. Quanto maior o consumo, maior o impacto causada pela apneia. Nessa noite, assim que eu caía no sono, eu parava imediatamente de respirar. O corpo, como diria Roberto Abras, "sentindo o drama", dava um choque de adrenalina para a respiração voltar e não me deixar morrer. Com isso, eu acordava com um pulo, muito assustado, o coração disparado. E isso se repetiu por toda a noite. Sono, apneia, choque de adrenalina, coração disparado. Foi a pior noite da minha vida. Eu morria de sono, mas não queria dormir, porque achava que iria morrer com uma parada cardíaca. Foi uma noite extremamente paranoica. E não é preciso ser nenhum gênio para saber que esse problema pode acarretar doenças cardíacas.



PARTE 04 - "YOGA"

Essa música representa a Cura. Existem várias formas de se dar a volta por cima quando o álcool se torna uma espécie de problema na sua vida. Claro que a gravidade influi no tratamento. Mas de uma maneira geral, o básico é buscar uma mudança de rotina. Descobrir novos prazeres, novos hobbies, novos objetivos, e focar neles. Quando tive o problema narrado na música anterior, decidi buscar algo novo na minha vida. E foi quando descobri o Yoga. Essa prática maravilhosa traz um novo diálogo consigo mesmo, uma nova relação com o próprio corpo, uma busca pelo controle total do corpo e da mente. É um diálogo que vem de dentro para mais dentro ainda, e descobri-lo me trouxe uma grande ajuda, não só para ter um maior controle sobre meu psicológico, mas também física. É uma prática de relaxamento, meditação, concentração, respiração. Se você precisa dessa mudança de hábito, o primeiro a se fazer é descobrir o seu próprio yoga.


Encerro a postagem deixando o meu imenso agradecimento ao artista amigo André Burian, que permitiu que eu usasse sua pintura como arte deste trabalho. É o tigre da sua série fantástica SEOMAR. Procure mais nas redes do artista.
 
Grande abraço a todos!